"Demorei-me a contemplá-las, sob aquele céu clemente, a ver as borboletas esvoaçando por entre urze e as compânulas, a ouvir a brisa suave soprando através da relva e a pensar como poderia alguém imaginar, sequer, sonos agitados sobre aquela terra."
Emily Brontë

5 de junho de 2014

Voltei à casa. Com esta, são duas as vezes que aqui estive depois. E o que mais me surpreende é o pouco que este local muda de cada vez que o vejo. Faz-me lembrar o quão pequenos somos e o pouco tempo no mundo que para nós, é uma vida. Faz pouco mais de um ano desde a primeira vez aqui. As gavetas arrumadas, os maus sentimentos fechados à chave, e para nós as três só risos e cachecóis amarelos, e muita felicidade. As memórias tornam-se embaciadas, quase impossíveis de reviver. Espera. É incrível. Ainda ouço a flauta ao longe, tal como dantes. A pele do músico envelheceu, noto. Mas os seus dedos têm a mesma vivacidade de sempre, e não evito sorrir enquanto o vento, este vento tão familiar, me sopra na cara. Talvez consiga soprar mais forte, e traga uma terra do norte para aqui. Ou então talvez me consiga levar para lá, se ficar mais leve e conseguir que as minhas tristezas se transformem em água. Consigo ver o nosso caminho a desaparecer, ramos de árvores que foram arrastadas cobrem-no e só eu sei que houve um dia uma estrada. Aqui, sozinha, sinto uma nostalgia alarmante, quase sufocante, que me pica os olhos. É uma agonia que permanece, sempre num ponto sereno, mas a sua duração enlouquece-me. Ao me sentar sozinha, concentro a minha atenção na casa onde fomos tão felizes. Quantas pessoas poderiam levar, e levaram-na a ela. Quase que me rio da injustiça que cresce dentro de mim ao refletir na crueldade da vida que leva para longe aqueles que pertencem perto e mantém junto aqueles que deviam ir. As experiências que podiam ser vividas, as histórias que podiam ser contadas, tudo o que ficou por fazer.
Daria tudo para ali voltar, não só, com elas, e viver tudo outra vez. Tudo de novo, e voltar a sentir-me naquela paz, livre de pesos e de amarguras. Passam horas, e eu olho para o céu, para as árvores, para os pássaros, e faz-se tarde. O pastor parou de tocar e foi, provavelmente para casa. Também ele? O que eu daria para voltar, para o abraçar e agradecer as horas que me deu música, que me acalmou e alimentou a minha alegria. Queria que visse o meu sorriso, a minha felicidade e a calma que me transmitiu, juntamente com este lugar. Toco na relva e os meus dedos escrevem uma melodia de que me lembro. E sei que, não importa quantas vezes aqui volte, me vou sentir assim, um misto de alegria e tristeza, como se voltasse atrás no tempo.

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